01-07-2012
A
Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a
condenação da Google Brasil Internet Ltda. a pagar indenização por danos
morais, no valor de R$ 20 mil, por não ter retirado do ar ofensas
publicadas em blog contra diretor de faculdade em Minas Gerais. A Turma
entendeu que não se pode responsabilizar direta e objetivamente o
fornecedor do serviço pelas ofensas de terceiros, mas sua omissão pode
ser penalizada.
O diretor acionou o Google depois de encontrar
conteúdo difamatório produzido por alunos no site Blogspot, mantido pela
empresa. Ele obteve tutela antecipada determinando a remoção das
mensagens, mas a ordem não foi cumprida pela empresa. Houve então
condenação em R$ 20 mil a título de danos morais.
O Google
recorreu ao STJ, argumentando que o provedor não podia ser
responsabilizado por material divulgado por terceiros. Alegou também que
a empresa só não forneceu o endereço eletrônico (IP) do responsável
pela postagem por estar impossibilitada, por força de norma
constitucional, de identificar o usuário, ressalvando que “não houve
pedido e muito menos ordem judicial determinando a quebra do sigilo dos
dados”.
Internet e consumo
A ministra Nancy Andrighi
afirmou que nem a gratuidade do serviço prestado pelo provedor nem seu
aspecto virtual descaracterizam a relação de consumo. “No caso do
Google, é clara a existência do chamado cross marketing, consistente
numa ação promocional entre produtos ou serviços em que um deles, embora
não rentável em si, proporciona ganhos decorrentes da venda de outro”,
esclareceu.
“Apesar de gratuito, o Blogspot exige que o usuário
realize um cadastro e concorde com as condições de prestação do serviço,
gerando um banco de dados com infinitas aplicações comerciais”,
afirmou. “Há, portanto, inegável relação de consumo nos serviços de
Internet, ainda que prestados gratuitamente”, concluiu.
Filtragem ativa
No
entanto, a relatora estabeleceu limites para a responsabilidade da
empresa. “O serviço do Google deve garantir o sigilo, a segurança e a
inviolabilidade dos dados cadastrais de seus usuários, bem como o
funcionamento e a manutenção das páginas na internet que contenham os
blogs individuais desses usuários”, anotou.
Mas ela ponderou que a
fiscalização do conteúdo postado pelos usuários não constitui sua
atividade intrínseca, não sendo possível considerar defeito do serviço a
falta de exame do conteúdo gerado pelos usuários. “Tampouco se pode
falar em risco da atividade como meio transverso para a
responsabilização do provedor por danos decorrentes do conteúdo de
mensagens inseridas em seu site por usuários. Há de se ter cautela na
interpretação do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil de 2002”,
afirmou.
Para a ministra, não se pode considerar que o dano moral
a terceiros seja um risco inerente às atividades dos provedores de
serviço de internet, já que não implicam riscos maiores para esses
terceiros que as atividades comerciais em geral.
Violação de sigilo
A
ministra Nancy Andrighi ainda considerou que a filtragem prévia de
conteúdo viola a Constituição Federal: “O controle editorial prévio do
conteúdo das informações se equipara à quebra do sigilo da
correspondência e das comunicações. Não bastasse isso, a verificação
antecipada, pelo provedor, do conteúdo de todas as informações inseridas
na web eliminaria – ou pelo menos alijaria – um dos maiores atrativos
da internet, que é a transmissão de dados em tempo real”, completou.
“Em
outras palavras, exigir dos provedores de conteúdo o monitoramento das
informações que veiculam traria enorme retrocesso ao mundo virtual, a
ponto de inviabilizar serviços que hoje estão amplamente difundidos no
cotidiano de milhares de pessoas, como é justamente o caso dos blogs
cuja dinâmica de funcionamento pressupõe sua rápida e constante
atualização. A medida, portanto, teria impacto social e tecnológico
extremamente negativo”, asseverou a relatora.
Subjetividade discricionária
“Mas,
mesmo que fosse possível vigiar a conduta dos usuários sem
descaracterizar o serviço prestado pelo provedor, haveria de se transpor
outro problema, de repercussões ainda maiores, consistente na definição
dos critérios que autorizariam o veto ou o descarte de determinada
informação”, acrescentou.
“Ante a subjetividade que cerca o dano
moral, seria impossível delimitar parâmetros de que pudessem se valer os
provedores para definir se uma mensagem ou imagem é potencialmente
ofensiva. Por outro lado, seria temerário delegar o juízo de
discricionariedade sobre o conteúdo dessas informações aos provedores”,
alertou a ministra.
Desamparo social
Porém, a relatora
entendeu que não seria razoável afastar qualquer responsabilidade dos
fornecedores de serviços de internet usados para atividades ilegais. Ela
comparou normas internacionais e projeto de lei brasileiro que tratam
das responsabilidades desses fornecedores, tendendo a afastar a
fiscalização prévia, mas impondo a ação imediata em caso de
notificações.
“Realmente, este parece ser o caminho mais
coerente. Se, por um lado, há notória impossibilidade prática de
controle, pelo provedor de conteúdo, de toda informação que transita em
seu site; por outro lado, deve ele, ciente da existência de publicação
de texto ilícito, removê-lo sem delongas”, afirmou.
Identificação e anonimato
A
relatora acrescentou às obrigações do Google o dever de propiciar meios
que permitam a identificação de seus usuários, sob pena de
responsabilização subjetiva por negligência.
“Dessa forma, ao
oferecer um serviço por meio do qual se possibilita que os usuários
externem livremente sua opinião, deve o provedor ter o cuidado de
propiciar meios para que se possa identificar cada um desses usuários,
coibindo o anonimato e atribuindo a cada manifestação uma autoria certa e
determinada”, asseverou a ministra.
Ela observou que não se
trata, porém, de burocratizar excessivamente a internet. “Há de se ter
em mente, no entanto, que a internet é reflexo da sociedade e de seus
constantes avanços. Se, ainda hoje, não conseguimos tutelar com total
equidade direitos seculares e consagrados, seria tolice contar com
resultados mais eficientes nos conflitos relativos à rede mundial de
computadores”, considerou.
“Em suma, pois, tem-se que os
provedores de conteúdo: não respondem objetivamente pela inserção no
site, por terceiros, de informações ilegais; não podem ser obrigados a
exercer um controle prévio do conteúdo das informações postadas no site
por seus usuários; devem, assim que tiverem conhecimento inequívoco da
existência de dados ilegais no site, removê-los imediatamente, sob pena
de responderem pelos danos respectivos; devem manter um sistema
minimamente eficaz de identificação de seus usuários, cuja efetividade
será avaliada caso a caso”, concluiu.
Fonte: Agência STJ
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